domingo, 29 de junho de 2014

Aparição

De roupa interior olho-me ao espelho longamente. Os anos passaram por mim e deixaram as suas marcas. Linhas k mapeiam onde outrora guardava a juventude.
Contemplo-me longamente. Inclino a cabeca ligeiramente como que a apreciar uma qualquer obra de arte esquecida na cave de um Museu que so o é por falta de nome melhor para um local que alberga lembrancas esquecidas. 
Com um calafrio sinto o passar de uma sombra que na frecha de luz vinda de fora me olhava há já algum tempo.
Deixai-as olhar. O que outrora tiveram e desprezaram. Outras saudosamente olham para a beleza reflectida no espelho e pensam nas mal fadadas escolhas que a vida lhes ofereceu no princípio de tudo. No princípio de mim.
Ericam-se-me os cabelos da nuca e sinto o teu cheiro. Sorrio... Apenas no reino onirico nos vemos quando queremos sem o medo dos olhos que queimam, das fotografias que roubam a alma e das bocas de linguas bifidas que sibilam segredos que pertencem aos outros.
Vês o meu sorriso travesso como um indicio que te esperava e sinto as costas resguardadas do frio pelo calor que emanas da alma.
Abraças -me por trás e olhamo-nos nos olhos no espelho que nos reflecte a nós. 
A tua mão traça as linhas no meu ventre que parece prenhe dum miudo perdido e duma raposa assustada. Uma cicatriz imposta para esconder uma outra, infinitamente maior, mas que nunca se vera.
Afastas o meu cabelo e beijas-me onde o pai da razão se senta lendo o jornal. Sábio este homem.
Ja n ha volta a dar. Mesmo k mo neguem. Mesmo que me espezinhem, mesmo que me roguem pragas, morro na certeza porém que tenho Pessoa em mim.
A tua mão escorrega pela minha barriga e sinto-a passando por cima da fimbria do meu desejo.
O teu desejo, esse, senti assim que as carnes se tocaram, testemunha que se trata dum sonho mas não menos prazeroso que as memórias que o criaram.

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